Existe um problema de saúde, um problema feminino, são os chamados miomas uterinos. Até 40% das mulheres vão ter miomas durante a vida. Muitas descobrem a doença quando estão tentando engravidar e têm medo de não conseguir realizar o sonho de ter filhos.
Mas você sabia que apenas alguns miomas causam infertilidade? Recebo com grande frequência o seguinte questionamento das pacientes: “Eu tenho um mioma de determinado tamanho e em determinada localização. Ele é o causador da minha infertilidade?”
Vamos discutir um pouco essa situação, que pode comprometer até 40% das mulheres e, na maior parte das vezes, não causa infertilidade, embora gere medo e desinformação.
Primeiro: mioma sempre causa infertilidade? Não. Isso é mito. A maior parte das mulheres nunca vai vivenciar a infertilidade. Estima-se que no máximo 2% das portadoras de miomas tenham infertilidade como consequência da doença. É importante dizer que a infertilidade pode ser causada por diversos fatores, inclusive masculinos. Portanto, a minoria das mulheres com miomas vai ter infertilidade.
Segundo: se não tenho infertilidade, mas tenho mioma, vou ter algum outro sintoma, então? Também é mito. A maior parte das pacientes recebe o diagnóstico de mioma no ultrassom de rotina, que encontra um nódulo em alguma posição do útero, mas sem nenhuma importância clínica.
Terceiro: tenho mioma. Ouvi falar que isso é um tumor. Não vou ter um problema maior com isso? Outro mito. A minoria dos miomas pode ter um padrão de crescimento ou uma degeneração que indique que, um dia, efetivamente, ele pode se transformar em uma doença maligna.
Assim, na maioria dos casos, é feito apenas o diagnóstico da doença, sem a necessidade de qualquer tipo de intervenção clínica, intervenção cirúrgica, nem de técnica de reprodução assistida. É necessário apenas informar, conhecer e acompanhar.
Para entender melhor por que algumas mulheres têm sintomas e outras não, é importante conhecer as camadas do útero: a camada mais externa – serosa; o miométrio, que é a camada intermediária e muscular; e o endométrio, que é a interna. De forma resumida, os miomas, que são bolinhas, nódulos benignos, podem crescer em quaisquer dessas camadas.
Os miomas subserosos são os que crescem para fora; os intramurais são os que crescem no músculo; e os submucosos são os que crescem do músculo para dentro da cavidade uterina.
Os miomas subserosos são muito frequentes e geralmente não causam problemas. Os intramurais podem causar mais cólicas menstruais. Se eles crescerem e desviarem a parte interna do útero, também podem aumentar o fluxo menstrual e impactar na fertilidade.
O tipo de mioma mais importante a discutir: submucoso. Miomas submucosos são aqueles que crescem do músculo do útero, porque o mioma é uma doença do músculo do útero que teve um crescimento desordenado daquele músculo, e formam um nódulo. Se esse nódulo crescer totalmente para dentro da cavidade uterina, causa uma distorção na cavidade uterina.
Essa distorção, em algumas mulheres, aumenta o fluxo menstrual e provoca mais cólicas. Já em outras mulheres, causa uma dificuldade do processo de implantação do embrião, quer esse embrião tenha sido formado naturalmente pela relação sexual, quer esse embrião tenha sido formado nas técnicas de reprodução assistida.
Portanto, apesar de ser uma doença muito frequente, uma parcela muito pequena das mulheres vai precisar receber algum tipo de tratamento para restaurar sua fertilidade.
O principal método para diagnosticar o mioma uterino é um ótimo ultrassom transvaginal. Em alguns casos, precisa-se também de uma ressonância magnética, mas, habitualmente, o ultrassom é suficiente para fazer o diagnóstico. Assim, a paciente tem os sintomas, passa por um método de imagem e encontra-se o problema, o mioma.
Quem precisa de tratamento? A paciente que tem sintoma, como cólica intensa, aumento do fluxo menstrual ou infertilidade. Aquelas que têm aumento do fluxo ou cólica, muitas vezes, precisam apenas de um tratamento clínico, sem a necessidade de cirurgia. Podemos, por exemplo, dar alguma medicação para regular o sangramento e diminuir também a cólica. Nesse caso, o tratamento é feito só durante a menstruação.
Pode-se também prescrever métodos hormonais, como pílulas anticoncepcionais, que vão melhorar a cólica e diminuir o sangramento. Outra possibilidade são alguns tipos de DIU, que vão, também, regularizar o ciclo menstrual da paciente.
Resolve-se, assim, uma boa parte do tratamento das mulheres com dor. No entanto, algumas pacientes com dor vão precisar de algum tratamento cirúrgico. Se a mulher já teve filhos, tem 45 anos ou mais, não deseja mais engravidar e não teve sucesso com o tratamento clínico, ela pode ser candidata a um tratamento cirúrgico para a retirada do útero – histerectomia.
Outras pacientes não desejam fazer histerectomia, ou nunca tiveram filhos, ou ainda pretendem engravidar. Nesses casos, necessitam de outro tipo de tratamento cirúrgico, sendo o tratamento de eleição a miomectomia.
Mas para indicação do melhor tratamento, o método de imagem é muito importante. O ultrassom é ótimo para diagnosticar o mioma, mas nem sempre ele consegue fornecer todas as informações sobre tamanho, número dos miomas e localização exata.
Muitas vezes, outros métodos precisam ser solicitados, como a ressonância magnética ou uma histeroscopia diagnóstica. Há esses três métodos de imagem que mostram onde está cada um dos miomas que aquela paciente tem. Com esse mapeamento, indica-se a miomectomia, uma cirurgia minimamente invasiva. Nessa intervenção, não se retira o útero da paciente.
Há ferramentas terapêuticas diferenciadas que podem ser indicadas, conforme a situação específica. Algumas pacientes precisam de tratamentos cirúrgicos mais avançados: uma miomectomia por via robótica, ou por via laparoscópica, ou, em alguns casos, até com o corte como se fosse da cesárea, técnica chamada de laparotomia. Esses tratamentos são indicados para miomas maiores ou quando há um grande número deles. É importante retirar todos esses miomas e a melhor abordagem é por uma dessas vias.
Já mulheres que têm miomas que comprometem só a parte interna do útero, os miomas submucosos, são tratadas com a histeroscopia cirúrgica, técnica que também pode ser feita para realização da miomectomia.
Histeroscopia é olhar dentro do útero. Uma das modalidades é chamada cirúrgica porque acopla-se à câmera utilizada, que olha dentro do útero, um instrumental que irriga, que joga um soro fisiológico dentro do útero.
Acoplado a tudo isso tem um aparelho que faz corte e cauterização daquele mioma que está distorcendo a cavidade uterina. Costumo dizer que a histeroscopia cirúrgica é uma plástica feita no útero para deixá-lo na melhor conformação possível para receber a gravidez.
É interessante saber que todo esse aparato tecnológico – uma câmera, luz, soro fisiológico, um tubo pelo qual o soro entra, outro tubo pelo qual o soro sai, um instrumento para cortar e cauterizar – cabe num instrumental que tem um centímetro e pouco de diâmetro, é muito fino.
A histeroscopia não faz nenhum tipo de corte. É uma cirurgia feita por via vaginal. O aparelho é inserido no colo do útero da paciente e consegue visualizar e tratar tudo o que está acontecendo naquela região. Dessa forma, as pacientes com infertilidade causada por miomas submucosos podem ser tratadas por esse método cirúrgico minimamente invasivo.
Quais são as pacientes que merecem um tratamento cirúrgico para retirada de miomas, visando restaurar a fertilidade para tentativa natural de gravidez, ou visando melhorar as chances de sucesso nas técnicas de reprodução assistida?
Basicamente, todo mioma que cause uma distorção da parte interna do útero, classificado como submucoso, merecerá um tratamento cirúrgico via histeroscopia cirúrgica. Outra indicação são miomas maiores de 3 cm que comprometem o miométrio. Pacientes com esse tipo de mioma, principalmente as que tiveram falhas em tratamentos de reprodução assistida anteriores, também recebem indicação de tratamento cirúrgico.
Pacientes que apresentam miomas subserosos quase nunca precisam de tratamento cirúrgico. A exceção a isso são pacientes com miomas muito volumosos, miomas maiores do que cinco, seis, sete centímetros, que, durante a gravidez, tendem a crescer ainda mais e causar outros sintomas.
Dessa forma, apesar de naquele momento o mioma não ser um problema, às vezes, indica-se a miomectomia para tratar esses miomas subserosos a fim de garantir que a gestação tenha uma evolução mais tranquila.
Quando a paciente passa pela retirada de miomas por via histeroscópica, sem corte na parede uterina, logo depois do procedimento – um ou dois meses depois –, a paciente já pode engravidar. Nada vai mudar na gravidez dessa paciente, nem no parto. Então, se você retirou um mioma submucoso, em dois meses, no máximo, você já está liberada para engravidar. Se engravidar, você vai poder optar pelo parto normal ou cesárea. A cirurgia anterior não vai mudar a indicação do tipo de parto.
Agora, se você teve miomas intramurais que precisaram ser tratados com cirurgia robótica, laparoscopia ou laparotomia, ou seja, se houve a necessidade de corte da parede do útero para retirar o mioma e depois fazer uma rafia, dar pontos nessa parede do útero, esses locais de que os miomas foram retirados e foram suturados pelo cirurgião são áreas de menor resistência do seu útero.
Essas áreas, quando o seu útero crescer e entrar em trabalho de parto, correm o risco de se romper. Isso é uma situação muito grave para a gravidez. Por isso, pacientes submetidas a miomectomias por laparotomia, laparoscopia ou cirurgia robótica não podem entrar em trabalho de parto. Nesses casos, a indicação é de uma cesárea agendada.
Outro dado importante: essas pacientes que passaram por cirurgias uterinas para retirar miomas têm que esperar pelo menos três meses, às vezes até mais, para ser liberadas pelo seu ginecologista para tentar engravidar, diferentemente daquela paciente da histeroscopia, que em um ou dois meses já pode engravidar.
Se você conhece alguém que está preocupada com o mito de que o mioma é um problema que causa infertilidade, envie esse texto, compartilhe essa informação, que isso pode ser interessante e pode ajudar muitas pessoas.